quinta-feira, 27 de junho de 2013

o café segura meus olhos
o cansaço segura minha xícara
como a teimosia segura meus amores
e o juízo minha malicia.
Prazer é ler
um livro rasurado
onde o realce
é um poema magoado.




Moleskine, anotações antigas III

o deleite oscilava
em carnes frívolas
misteriosas.
surgiu no momento
extraordinário
que o encarde pervertido
ficara lícito, explicito e consentido. 

veemente e impiedosa paixão.


vem cheia de munição.

Moleskine, anotações antigas II

impossível pode ter sido tudo
menos nosso amor,
se chegou a ser
se é que me entende
que nitidamente
eu vi ele florescer. 

como foi os versos claros
das manhãs tardias
(as das dezesseis horas)
passavam algumas vezes
das dezesseis...
mas entre cobertores
nem lembrávamos do tempo
que atento
sacudia o fato
que chegara nosso entardecer.

tu, pileque cabisbaixo
que tomei com vodka pura,
que ingeri como veneno
e lambi como cura.

confino as virgulas e reticencias
como partes do meu eu
de um amor possível
dilacerado, louco e cabível
que não aconteceu.



Moleskine, anotações antigas I

não venhas de mãos sujas em cima de mim.
odeio seus anseios de explorar entranhas desconhecidas
e depois choramingar em versos
pra eu me sentir atraída.

gosto das palavras como de cheiro no pescoço
tu sabe, tu me lê, 
com um olhar estranho
um olhar insosso.
conheces as regras do meu corpo
conheces
sem confinamento
sem pudores
e sem bons comportamentos.
a graciosidade
da arte
é o amor que 
sempre parte

parte 
o coração.

e o desmazelo
torna-se inspiração.

Sobre respeito...

gostaria que o respeito não fosse algo supérfluo como na visão de muitos. aqueles que se dizem respeitosos por ouvir um velhinho, ou por dar licença pra alguém que queira passar. o respeito deveria ser algo que todos no subconsciente tivessem cravado. que respeitassem a pessoa amada sem mais tarde a difamar no jogo de sinuca com os amigos. que respeitassem dando lugar ao idoso sem maldizer dele quieto até o ponto de chegada. que respeitassem a opção sexual de alguém simplesmente por ser alguém como você, de carne e osso. que respeitassem a religião do alheio sem se obstinar a convencê-lo que a sua é a correta. que respeitassem a reputação de alguém sem repassar o que ''ouviu dizer''. que respeitassem o silencio da biblioteca deixando os assuntos não importantes pra depois. que respeitassem o cesto escrito lixo para não ver os bueiros entupidos no noticiário..
enfim, algumas coisas banais que me fazem duvidar da sapiência do homo.

quarta-feira, 26 de junho de 2013

A floriculturista

Para ele, o melhor horário do dia é o do almoço. Não só porque esse é o tempo de relaxar do estresse de ser um publicitário corrido, mas porque no caminho do restaurante existe uma floricultura.  Na faixa de entrada uma cor rosa com janelas amarelas, o que seria pop arte se a arquitetura não fosse de um uma sutileza tão neoclássica.  Alguns vasos do lado de fora com Gérbera, Áster e Aveca. Em forma de placa, um quadro- negro encostado no canto, onde se escreve todos os dias recados amorosos. Shakespeare tinha seu nome cravado quase toda semana. Mas Carlos Drummond, Vinicius de Moraes, Chico Buarque costumavam marcar bastante presença também. Pela janela se via uma moça de uns vinte e poucos anos que trabalhava alegre. Estava sempre com um rabo de cavalo e o avental amarelo com terra. Usava galochas coloridas e estampas florais. Sua fisionomia era delicada, meiga e tinha a mania de contagiar os clientes quando saia sem querer seu sorriso frouxo.

Hoje a vez foi de Cazuza ‘’eu preciso dizer que te amo, te ganhar ou perder sem engano’’.  E ele como faz a mais de dois meses passava com lentidão por ali. Sentou-se no banco do outro lado da rua pra fumar o cigarro que tanto esperava enfurnado em sua sala. Como de praxe observava ela disfarçadamente.Como ela estava linda, com a harmonia da vida sincronizando com seus passos leves. Com o rabo de cavalo por fazer sendo lançado em direção ao vento. Com os gestos uniformes, charmosos como se ela fosse uma princesa recém-saída de seu castelo. Com o olhar distraído, ingênuo. Ela era realmente apaixonante.


Hoje mais que dia de Cazuza no quadro, era dia de atravessar a rua.




terça-feira, 25 de junho de 2013

ninguém se cura da dor sozinho.
alguns precisam de analistas, psiquiatras.
outros de religião, entorpecentes.
crença em horoscopo. em numerologia.
em um novo amor.
tem gente que precisa de tudo isso junto.

eu por exemplo, não me deixo curar sem estar totalmente anestesiada com doutrinas, credos e vícios. preciso de todos ao mesmo tempo
e com fartas porções de leituras.

segunda-feira, 24 de junho de 2013

24/06

passei a tarde inteira com o telefone na mão. atitude nula. não iria te ligar, não esse ano. já faz tempo e talvez agora devêssemos não tocar a campainha, nem discar o telefone. por essa tarde embora lamuriosa me segurei. o tempo passou segundo por segundo com a minha alma atordoada de lembranças.
queria te contar segredos que guardo, pois só tu entenderia, somos o inverso: semelhantes que se atraem. queria conversar sobre rock'n'roll e sobre o ultimo livro do Lobão. queria saber se tu ainda é um petista fervoroso, e se tu terminou o livro do lula que te dei no nosso ultimo aniversario. se tu participou ativamente dos manifestos pois sempre fomos muito ativistas. queria saber como tu estas, como anda a faculdade, as bandas, a família. queria ouvir sua voz já que seu rosto é impossível. ver seu rosto é como entrar em um ciclo infernal.
agora ando convicta de que já te vi pela ultima vez. na frente do bar, com perguntas retoricas, e uma vontade assustadora de me jogar em seus braços.
com a gente sempre foi tudo, não é?
infelizmente na vida relacionamentos duradouros são entre cumplicidades amenas, não prazeres viscerais.
o meio termo.
o equilibro.
não o céu nem o inferno.

os maldizeres nunca me importaram.
nem vão.
diferente de muitos: eu me conheço!

Desgaste. São só sobras de uma boemia que não pertence mais a idade, esta que a vaidade não me permite revelar. o tempo leva tudo menina... tudo.  a primeira coisa a ir é a lucidez, horas tu se encontrará pateticamente ébria junto a seu copo de whisky, na sarjeta.
depois, leva os seus amantes... deixando um desmazelo que nunca te pertenceu. com eles foi-se as noites festivas, os lençóis sujos, as paixões atormentadoras, destas que adoecem e alimentam a alma.
a pele de boneca vai-se embora, e talvez esse seja o maior trauma da vida de uma mulher. pois o almejo masculino em doses ínfimas por suas pernas metodicamente cuidadas por baixo das meias, extingue-se.
bom... me afogo nessas taças desleais.

Meu clamar:

- Volte!






domingo, 23 de junho de 2013

sentada no bar, uma voz familiar me disse que tu estas chato hoje em dia. pratiquei descaso e mudei de assunto (oras, tu sempre foi intolerável). as noticias sobre ti continuam a chegar sem permissão. o silencio que estamos não adianta em nada quando teus barulhos ainda me perseguem, tua imagem ainda tira o sono e teu numero de telefone ainda vive na minha mente, decorado.
pensei em mandar uma mensagem dizendo que tenho uma sobra de tempo, que não ando trabalhando muito, que estou com vontade de ir na Arcadia, que venci mais um período da faculdade, que minha gaita esta abandonada e que não componho mais pra noites despropositais.
fica só no querer, fica só no quase mandei mensagem.

domingo, 2 de junho de 2013

Como coube a saia curta de couro, coube perfeitamente a luxuria. Olhou-se no espelho e alinhou o risco feito a delineador do lado esquerdo, ao qual ficara um milésimo mais largo que o direito, droga. Nos lábios cor de sangue, cor de paixão, cor de rosas, cor Mate. Vestiu a meia nas mesmas pernas que confundiu entre lençóis com um babaca qualquer. Colocou seu salto fino, ao qual já havia pisado no amor, furado a ferida exposta. Um amor que de tão desgastado já havia dilacerado e por fim dissecado. O vestido era apenas uma arma, não de fogo mas tão perigosa quanto. Pois nunca saia desprevenida, sempre armada.
Pobres coitados aqueles que embriagados pelo embalo do seu quadril lhe oferecem bebida, pois mais tarde oferecem-a também a vida.
E quanto a isso, ela é cruel.